Artistas e jornalistas comentam os caminhos no mercado de quadrinhos na mídia
Contar histórias por meio de quadrinhos ou ilustrações é quase tão
antigo quanto a escrita. Para quem busca construir uma carreira na área,
IMPRENSA procurou jornalistas e desenhistas com experiência em mídia
impressa e digital para falar sobre os meandros de trabalhar com
comunicação e arte.
Adão Iturrusgarai, cartunista com mais de 30 anos de estrada e tirinhas publicadas na Folha de S. Paulo
desde a década de 1990, tem uma fórmula para o sucesso na profissão:
“33% sorte, 33% inspiração e 33% transpiração”, brinca. “É um trabalho
tão complicado… Quer dizer, todas as carreiras são complicadas, mas acho
que, quando você trabalha com algo ligado à arte, precisa ter muita
paciência, é muito demorado.”
“O mais difícil quando eu comecei foi o próprio começo. Ninguém te
conhece, você tem que fazer campanha em prol de si mesmo. Eu inventava
umas exposições, levava meus desenhos nos lugares, batia de porta em
porta, enfim… A maior dificuldade é convencer alguém de que seu trabalho
vale a pena”, continua Adão.
O cartunista diz que acompanha os novos nomes no mercado de
quadrinhos no Brasil e destaca como a internet funciona como uma
excelente plataforma. “Graças à internet, você vê muito mais esses novos
autores. Mas o mais difícil é conseguir um espaço onde te paguem.
Aparecer é mais fácil, por um lado, mas ser remunerado por isso é
complicado”, afirma.
Pedro Leite, ilustrador e publicitário autor dos
“Quadrinhos Ácidos”, “Tirinhas do Zodíaco” e da coleção de cartuns “Onde
Meu Gato Senta”, publica seus trabalhos na internet e em livros
independentes. Nas redes sociais, seus desenhos chegam a alcançar mais
de 100 mil visualizações em poucas horas após a divulgação. Ele destaca
que a principal diferença entre trabalhar com web e com mídia impressa é
que o primeiro tem ganhado mais popularidade.
“A impressão que eu tenho é que os quadrinhos de jornal estão sendo
desvalorizados. Parece que os jornais não estão mais dando tanta atenção
quanto eles deram lá nos anos 1980 e 1990, quando eles publicavam muito
mais do que agora. O que acontece também é que, com a internet e as
redes sociais, se eu conseguir fazer um conteúdo de qualidade, eu
consigo ter muito mais leitores do que na mídia impressa”, diz o autor.
Não só para desenhistas
O
mercado de quadrinhos também tem espaço para jornalistas. Mesmo que
estes, muitas vezes, tenham pouca intimidade com o lápis e o papel. Sidney Gusman, por exemplo, é editor do site Universo HQ e responsável pelo planejamento editorial da Maurício de Sousa Produções.
O jornalista trabalha com quadrinhos desde 1990 e afirma que não
existe uma “receita” para o sucesso na área. “A primeira coisa,
obviamente, é você conhecer bastante de quadrinhos. Não é só ler a
coleção do Batman. É você tentar, ao máximo, ser plural nessa história,
abrir o seu leque o máximo possível.”
Gusman acrescenta que, hoje, o caminho para quem quer escrever sobre
quadrinhos é a internet: blogs, redes sociais etc. “Não tem um baita
mercado hoje [de quadrinhos], mas estamos em uma pequena expansão”,
continua o jornalista. “Eu vejo que nós estamos subindo a serra,
engatando a segunda, mas tem caminho. Os profissionais que quiserem
trabalhar nessa área precisam estar atentos e preparados.”
Outra área que chama cada vez mais profissionais da imprensa é o
gênero de jornalismo em quadrinhos. A ideia é utilizar a linguagem e a
mídia das HQs para veicular reportagens, de teor muitas vezes
investigativo, em forma de narrativas gráficas adultas.
O jornalista Augusto Paim
ministra palestras e oficinas sobre o assunto, além de ser curador e
organizador do 1º Encontro Internacional de Jornalismo em Quadrinhos de
2010 e discutir a prática em seu doutorado na Alemanha. Ele destaca,
porém, que é preciso estar atento para as diferenças entre jornalismo em
quadrinhos e meras ilustrações de reportagens.
“Criar uma HQ exige habilidades diferentes das de criar um texto ou
um filme, por exemplo. Uma pessoa que quer fazer uma história em
quadrinhos e não tem esse conhecimento vai fazer um trabalho ruim, em
que o desenho está só ilustrando o texto, ou vai estar repetitivo,
coisas assim. É necessário conhecer e dominar a linguagem. Não é todo
escritor que sabe fazer um roteiro de cinema. [...] Mas, antes disso
tudo, é preciso conhecer o jornalismo”, diz Paim.
O jornalista diz ainda que trata-se de uma área que exige muita
dedicação e estudo, já que muitos veículos ainda não se deram conta do
potencial dessa mídia. “O mercado tem crescido bastante para as pessoas
que estão se especializando. Claro que quem trabalha com isso, não
trabalha só com isso. [...] Para essas pessoas, as portas estão se
abrindo. Mas não digo que seria uma boa escolha para quem acabou de se
formar, por exemplo. Mas, para quem realmente gosta do tema, vale a
pena”, conclui.
Originalmente publicado no Portal Imprensa.
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